Cerco
Prefeitura diz que pretende abolir fechamento de praças com grades, como já aconteceu na Tiradentes
Ludmilla de Lima (ludmilla.lima@oglobo.com.br)
RIO - A retirada das grades da Praça Tiradentes abriu caminho para os pedestres e, também, a brecha para que seja discutida a extensão da iniciativa em outros espaços. A prefeitura informou na quarta-feira que estuda remover as grades de outras áreas de lazer, embora ainda não haja definição de locais nem cronograma. Hoje, no governo, não há qualquer proposta de fechar novas praças, política adotada no passado com a justificativa de proteger esses lugares. O assunto ainda é tratado com cautela pelo município, porque a ideia posta em prática na Praça Tiradentes divide a população, embora tenha o apoio de arquitetos e urbanistas, para quem os gradis representam um obstáculo à circulação e uma mancha na paisagem.
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O secretário municipal de Conservação e Serviços Públicos, Carlos Roberto Osório, garante que a fase das cercas em praças acabou:
- O número de cercamentos praticamente desapareceu. Não temos solicitações nem necessidade mais de fechar espaços abertos. Esse processo estancou, e estamos virando a curva para abrir os espaços de novo.
Ele afirma que a remoção de gradis deve ser estudada caso a caso, e que há locais onde o cercamento funciona bem, como na Praça Nossa Senhora da Paz, em Ipanema. Lá, como noticiou Ancelmo Gois em sua coluna no GLOBO , as grades estão sendo restauradas pela Comlurb.
Para o secretário, a arma contra a depredação desses espaços é a iluminação, e não os ferros:
- Estamos planejando não só retirar grades de praças, mas também de monumentos, como o que faz homenagem a Marechal Deodoro, em frente ao Campo de Santana. Na prática, muitas vezes, a população de rua vandaliza a própria grade, que vira um fator de aglomeração dessas pessoas.
O subsecretário municipal de Patrimônio, Washington Farjado, é um entusiasta da ideia. Arquiteto e urbanista, ele cita a Praça Nelson Mandela, inaugurada em maio deste ano, em Botafogo, e a General Osório, em Ipanema, cercada em 2002, como exemplos de áreas de lazer que poderiam ser abertas. Mas, para ele, a medida deve ser acompanhada de melhorias na segurança e na urbanização.
- O primeiro benefício da retirada é o visual. Você passa a ter uma leitura mais clara do espaço público, o que aumenta a sensação de segurança. O segundo é o pedestre poder circular mais livremente. Isso aumenta a vitalidade dessas áreas. Acho que dá para a gente pleitear a retirada das grades de outras praças. Mas isso não deve ser uma regra. É preciso olhar cada caso.
Grades viraram febre nos anos 90
A política de gradear as áreas de lazer virou febre no início dos anos 90, na gestão de Marcello Alencar na prefeitura. Mais de 20 praças foram cercadas, entre elas Tiradentes, Paris, Nossa Senhora da Paz, Serzedelo Correia e do Lido.
A polêmica, no entanto, é mais antiga. No início do século XX, o prefeito Pereira Passos mandou remover as grades que cercavam todas as praças do Rio, incluindo a Tiradentes. A medida gerou grande debate na cidade, com os opositores alegando questões de segurança. Um século depois, os argumentos serviram para que a prefeitura adotasse postura oposta à política de Passos.
- Dois anos depois de mandar retirar as grades, o Pereira Passos, no seu relatório de governo, constatou, com muita alegria, que a medida não tinha prejudicado em nada as praças, que ficaram mais bonitas. As áreas que depois foram cercadas, ao contrário do que diziam, tornaram-se vazias. Aconteceu com a Praça Tiradentes, que ficou morta, e a Praça Paris, onde há pouca circulação e as pessoas têm medo de entrar - afirma o arquiteto e historiador Nireu Cavalcanti.
Na opinião de Nireu, apenas o Campo de Santana e o Passeio Público, que já nasceram cercados, e o Jardim Botânico devem ter grades.
Nem sempre a grade é sinônimo de conservação impecável. A professora Marilza Machado, moradora do Leblon e frequentadora do Jardim de Alah, cercado para a Rio-92, reclama que o local tem manutenção precária. E que moradores evitam circular pela praça no fim da tarde, temendo assaltos. Mesmo assim, ela conta que há um clima maior de segurança com as grades:
- Arquitetonicamente falando, a grade não é legal. Mas acho necessária, porque, sem ela, seria perigoso. A gente se sente mais protegida assim. E acaba se acostumando a viver enjaulada.
A bancária Maiha Fayad, moradora da Glória, confessa que teria medo de caminhar pela Praça Paris, onde costuma ir com seu cão, sem o gradil. Lá, os portões são fechados às 22h e abertos às 6h, e a segurança é feita por uma base fixa da Guarda Municipal, durante 24 horas.
- Acho que não devem tirar. Na Glória, infelizmente, há muita população de rua.
A presidente da Associação de Moradores do Leblon, Evelyn Rosenzweig, é contra a remoção e aponta a Nossa Senhora da Paz como um exemplo de sucesso:
- Sou a favor de cercar, de ter horário para fechar e abrir. A cultura do carioca não é de preservar a cidade. É mais importante ter uma praça bem cuidada, com boa manutenção, do que aberta e sem nada.
Já a presidente da Associação de Moradores de Ipanema, Maria Amélia Fernandes Loureiro, pensa diferente:
- As grades foram colocadas num tempo em que a violência era maior.
Coordenador do movimento "Rio Eu Amo, Eu Cuido", Rafael Saladini também aprova praças livres:
- É um absurdo uma cidade tão bonita como o Rio ter praças cercadas, restritas.
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