O apartheid carioca: um retrocesso na democracia?
Artigo do leitor Bayard Do Couttto Boiteux
Comentários..Moro na cidade mais bonita do mundo: ela é um misto de natureza, de população alegre mas não feliz, de herança cultural, mas sobretudo da junção do asfalto e da favela. É talvez um dos poucos lugares do mundo onde condomínios de luxo convivem com comunidades em que o poder público passou longe ou simplesmente deixou que fossem ocupadas por um poder paralelo, que as amedronta e exige grandes esforços para a sua sobrevivência.
Minha grande luta, e espero que pelo menos nisso tenha podido herdar valores éticos de meu pai, já que infelizmente não tenho a coragem do mesmo, é buscar soluções para uma melhoria de qualidade dos mais desfavorecidos, através do turismo. Sempre entenderei que o turismo faz uma revolução silenciosa de unir pessoas diferentes, de ideologias, religiões e classes sociais. O grande objetivo da atividade turística é destruir os muros que existem nas cabeças das pessoas, que inibem uma verdadeira aceitação do diferente.
Nasci numa época em que ainda as escolas públicas eram frequentadas pela classe média e que grandes valores saíram do Pedro II, para citar apenas um exemplo. Lembro a convivência pacífica com a casa de cômodos, ao lado de nosso edifício na Tijuca e a admiração pelos colegas que ali moravam, como o filho do padeiro que levava bolos em datas festivas, que nos enchiam de alegria e respeito. Guardo até hoje lembranças que me permitem continuar admirando a força de um povo que a cada dia descobre uma nova falcatrua nas administrações públicas e privadas, mas que se ergue e continua lutando.
O Rio talvez apresente na praia o espaço mais democrático de um país, embora a mesma tenha se dividido por segmentos, como Ipanema, mas não por classes sociais.
Acabo de ver pela segunda vez o interessante filme israelense "Lemon Tree", que fez brotar em mim várias reflexões da divisão de um limoeiro, que passou a ser tratado como assunto de Estado por uma visão imparcial do terrorismo, mas também pela inexistência de um mundo aberto para o respeito das tradições .
A cidade já é dividida naturalmente: incluídos e excluídos. Os excluídos vivem uma "pseudovida" no entorno maravilhoso e lutam para conseguir vencer a crise. Por uma total falta de políticas públicas de habitação e proteção das áreas ambientais, a Cidade Maravilhosa viu crescer nos últimos anos as favelas e os condomínios de luxo que invadiram o verde e que ameaçam a sustentabilidade. E eis que surge uma idéia governamental de voltar ao feudalismo, ao Muro de Berlim ou mesmo ao Apartheid sul africano, criando em volta das favelas um muro de proteção, para que o proletariado não avance em construções irregulares e se submeta a um choque de ordem, que vai devolver um pouco de paz ao carioca.
Ledo engano e triste realidade que se cogite que o muro possa trazer algo positivo. Só o simbolismo de segregação que vem embutido neste conceito de proteção torna os excluídos mais uma vez excluídos. É como se já não bastasse o sufoco diário e que passa a ficar contido dentro de um gueto, parecido com aqueles feitos para separar os diferentes.'
Lutar contra os muros que já estão sendo erguidos mas que um dia poderão cair é uma batalha na qual temos que nos empenhar. O Rio turístico não merece ser comparado ao apartheid, como vários jornais estrangeiros vêm noticiando. O Rio merece respeito, sobretudo aqueles excluídos, que passam agora a fazer parte do gueto carioca, sob a bandeira da proteção ambiental...
Este artigo foi escrito por um leitor do Globo.
Minha grande luta, e espero que pelo menos nisso tenha podido herdar valores éticos de meu pai, já que infelizmente não tenho a coragem do mesmo, é buscar soluções para uma melhoria de qualidade dos mais desfavorecidos, através do turismo. Sempre entenderei que o turismo faz uma revolução silenciosa de unir pessoas diferentes, de ideologias, religiões e classes sociais. O grande objetivo da atividade turística é destruir os muros que existem nas cabeças das pessoas, que inibem uma verdadeira aceitação do diferente.
Nasci numa época em que ainda as escolas públicas eram frequentadas pela classe média e que grandes valores saíram do Pedro II, para citar apenas um exemplo. Lembro a convivência pacífica com a casa de cômodos, ao lado de nosso edifício na Tijuca e a admiração pelos colegas que ali moravam, como o filho do padeiro que levava bolos em datas festivas, que nos enchiam de alegria e respeito. Guardo até hoje lembranças que me permitem continuar admirando a força de um povo que a cada dia descobre uma nova falcatrua nas administrações públicas e privadas, mas que se ergue e continua lutando.
O Rio talvez apresente na praia o espaço mais democrático de um país, embora a mesma tenha se dividido por segmentos, como Ipanema, mas não por classes sociais.
Acabo de ver pela segunda vez o interessante filme israelense "Lemon Tree", que fez brotar em mim várias reflexões da divisão de um limoeiro, que passou a ser tratado como assunto de Estado por uma visão imparcial do terrorismo, mas também pela inexistência de um mundo aberto para o respeito das tradições .
A cidade já é dividida naturalmente: incluídos e excluídos. Os excluídos vivem uma "pseudovida" no entorno maravilhoso e lutam para conseguir vencer a crise. Por uma total falta de políticas públicas de habitação e proteção das áreas ambientais, a Cidade Maravilhosa viu crescer nos últimos anos as favelas e os condomínios de luxo que invadiram o verde e que ameaçam a sustentabilidade. E eis que surge uma idéia governamental de voltar ao feudalismo, ao Muro de Berlim ou mesmo ao Apartheid sul africano, criando em volta das favelas um muro de proteção, para que o proletariado não avance em construções irregulares e se submeta a um choque de ordem, que vai devolver um pouco de paz ao carioca.
Ledo engano e triste realidade que se cogite que o muro possa trazer algo positivo. Só o simbolismo de segregação que vem embutido neste conceito de proteção torna os excluídos mais uma vez excluídos. É como se já não bastasse o sufoco diário e que passa a ficar contido dentro de um gueto, parecido com aqueles feitos para separar os diferentes.'
Lutar contra os muros que já estão sendo erguidos mas que um dia poderão cair é uma batalha na qual temos que nos empenhar. O Rio turístico não merece ser comparado ao apartheid, como vários jornais estrangeiros vêm noticiando. O Rio merece respeito, sobretudo aqueles excluídos, que passam agora a fazer parte do gueto carioca, sob a bandeira da proteção ambiental...
Este artigo foi escrito por um leitor do Globo.
Bayard Do Coutto Boiteux é professor universitário e coordena o curso de Turismo da UniverCidade, no Rio de Janeiro
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