PUXADINHOS


  • Colocação de mesas e cadeiras nas ruas é regulada pelo decreto 322, de 1976, que ganhou força de lei em 1990
  • Segundo legislação, toda instalação deve ser removível
MANUELA ANDREONI (EMAIL)


Fome de espaço. O restaurante Sushi Leblon ocupa parte da calçada, deixando pequena passagem aos pedestres
Foto: Marcos Tristão / O Globo
Fome de espaço. O restaurante Sushi Leblon ocupa parte da calçada, deixando pequena passagem aos pedestres Marcos Tristão / O Globo
RIO — Há quatro anos, uma expressão invadiu o vocabulário do carioca: choque de ordem. Numa de suas primeiras ações para ordenar a cidade, o recém-eleito prefeito Eduardo Paes declarou guerra aos “puxadinhos” de bares e restaurantes. Os estabelecimentos que avançavam pelas calçadas, “privatizando” o espaço público, estariam com seus dias de impunidade contados. No entanto, um passeio pelo Rio quatro anos depois mostra que pouco mudou. Grande parte dos bares e restaurantes que receberam puxões de orelha da prefeitura em 2009, por invadir o reino das pedras portuguesas, continua na lista de 17 estabelecimentos que são alvo de ações do Ministério Público.
Restaurantes como o La Forneria da Lagoa, o Manekineko do Leblon, a Capricciosa de Ipanema, o Gambino do Largo do Machado e o Otto da Rua Uruguai continuam com estruturas muito parecidas com as de quatro anos atrás, como o “Globo a Mais” constatou. Alguns alegam que está tudo em ordem, mas o Ministério Público briga com os cinco na Justiça — e com outros 12, em alguns casos contra o próprio município, que concedeu as licenças.
A colocação de mesas e cadeiras em calçadas é regulada pelo decreto 322, de 1976, que ganhou força de lei em 1990. Segundo a legislação, toda instalação deve ser removível.
— O que me parece é que a prefeitura tolera esse tipo de coisa sob um olhar de arrecadação. Mas o espaço público não está à venda. Não há tributo que pague por isso — argumenta o promotor Carlos Frederico Saturnino, responsável por diversas ações civis públicas contra bares e restaurantes que “privatizam” calçadas.
Entre os 12, há nomes importantes para a agenda gastronômica e boêmia da cidade, como a Pizzaria Guanabara, o Bar Veloso — com os quais o “Globo a Mais” não conseguiu contato — e o Sushi Leblon — que não se pronunciou —, além do Sindicato do Chopp, em Ipanema. Saturnino Vilar Arman, dono do Sindicato do Chopp, surpreendeu-se quando foi abordado pelo MP. Ele diz que quando chegou ao local, há mais de 20 anos, o restaurante já tinha um puxadinho. No entanto, “para não criar problema”, a pedido do MP, derrubou toda a área construída em cima da calçada. O comerciante reclama, porém, que a regra não é clara.
— Então, está todo mundo errado. Ele (o MP) vai mexer nisso tudo? Então, vai derrubar o Rio inteiro. Acho que, antes disso, estado e prefeitura têm que entrar em acordo para que a gente saiba quais são as normas — reclama o comerciante, que paga trimestralmente cerca de R$ 3 mil para usar 40 metros quadrados de calçada.
Já o La Forneria, na Lagoa, alega que recuou sua varanda para deixar livres 2,5 metros de calçada e continua pagando a taxa de utilização do passeio à prefeitura. No entanto, o “puxadinho” tem estrutura permanente. Mesmo admitindo não ter mudado nada desde 2009, a Capricciosa diz que o projeto “foi aprovado e regularizado” e que “não há briga na Justiça”, por mais que seu processo ainda não tenha sido julgado, de acordo com o MP. Já os responsáveis pelo Manekineko, mesmo com o “puxadinho” ainda aparente, disseram que “a situação do restaurante na Rua Dias Ferreira está totalmente regularizada”. O Otto, na Tijuca, não se pronunciou.
As secretarias da Ordem Pública e de Urbanismo não esclareceram que tipo de licença um estabelecimento precisa para erguer varanda sobre a calçada. A Seop alegou que só cuida de mesas e cadeiras nas calçadas, e não de puxadinhos. A secretaria de Obras não se manifestou.
Apesar das polêmicas, a apropriação da calçada é um ótimo negócio. O restaurante Gambino, no Largo do Machado, “privatizou” 150 metros quadrados de espaço público pagando R$ 16,9 mil a cada três meses. Dono do Gambino, Silvio Pereira Marques admite que a “varanda” é irregular, mas acha que a repressão do Ministério Público é exagerada, por mais que ele tenha construído um piso sobre a calçada, coberto a área com telhado de alumínio e instalado ar-condicionado, quando a licença era apenas para colocação de mesas e cadeiras no passeio.



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