Metrô: após crateras e morte, moradores protestam contra falta de segurança
Estudo da Coppe/UFRJ já questionava capacidade de Ipanema para suportar este tipo de obra
Mário Sergio Souza Avellar é engenheiro civil e de segurança e trabalhou na construção do metrô no Catete e no Largo da Machado. Morador de Ipanema, ela observa os erros cometidos ao longo do processo de construção da Linha 4. “Eu não tenho informação de que tenha sido utilizado shield em um terreno arenoso do Rio de Janeiro antes. O risco disso é ter fuga de material, como aconteceu. Isso vai afetar os prédios laterais à obra. É preciso que se coloque tudo com mais transparência para saber realmente quais riscos tem essa obra”. Lembrando a morte de um operário do metrô Rio ontem, em Copacabana, o engenheiro reforça que as obras podem oferecer risco de vida para mais pessoas, operários e transeuntes. “Se abrir um buraco, como abriu da outra vez, e cair uma criança, um idoso? Como faz?”, questiona
A ex-jornalista e professora aposentada da UERJ Lilian Nabuco critica a gestão do Metrô Rio, da Odebrecht e do governo estadual. Para ela, “é preciso que uma comissão de técnicos, geólogos e engenheiros altamente competentes e isentos para que o público tenha uma justificativa consistente. Porque essa empresa e o governo não têm credibilidade pelo comportamento que tiveram até agora”. Sobre as crateras que surgiram no dia 11 de maio, Lilian diz: “Chegou ao cúmulo do engenheiro dizer que o que aconteceu na Praça Nossa Senhora da Paz foi um imprevisto e que daqui para frente o terreno é homogêneo e isso não vai acontecer novamente. Ora, se ele não previu a existência de uma rocha debaixo na Praça, como ele vai prever todo o percurso da Visconde de Pirajá à Ataulfo de Paiva até a Gávea? Não tem a menor coerência. Então ele diz que, se piorarem as rachaduras e se acentuarem os afundamentos, a gente vai monitorar. Ora, se ele, com monitoramento, não pode prever a tragédia que aconteceu na Praça General Osório, como ele vai prever todo o percurso pela frente? O governo devia ter escutado a COPPE, quando ela fez os estudos na época”.
O engenheiro Fernando Azevedo também é morador de Ipanema. Ele comentou a morte do operário na Linha 4 do metrô e criticou a condução das obras. “A história dos acidentes, como a morte daquele operário ontem, denotam a falta de segurança. É uma obra feita às pressas, com um prazo político e não técnico. O acidente não acontece sozinho, existe uma série de acontecimentos que resultam nele, como a falta de observação às questões de segurança”, explica. Outro ponto avaliado por Fernando é a necessidade de dar atenção ao mapa de fragilidade do solo para evitar transtornos. “O solo é heterogêneo e, quanto mais próximo da população e dos prédios, mais acentuado tem que ser o trabalho de reconhecimento prévio. Coisas que a gente não acredita que o Metrô fez. A Rua Barão da Torre está com prédios trincados e fissurados,além daqueles dois buracos. Isso tudo em um mês e meio”, analisa o engenheiro.
Eduardo Saggese é morador de Ipanema há 9 anos e vive os transtornos da construção desde o seu começo. “Eles trouxeram as máquinas, mas não trouxeram os engenheiros. O governo encomendou o tatuzão na Alemanha, mostrando que nós não temos domínio sobre essa tecnologia. Se a gente for comparar, o metrô de Londres está sendo escavado com dois shields, de 7,5 metros cada um. Como pode Londres avançar 150 metros por mês e aqui avançarmos 15 metros em um dia? É uma coisa estranha essa velocidade”, avalia. O ator Carlos Sato também estranha a rapidez das obras e comenta: “o barulho das máquinas ultrapassa a meia noite. Os operários não sabem conversar, eles berram. Não tem dia certo, não cumpre a lei do silêncio. Meu pai é muito idoso e doente. Ele está em pânico, com medo de perder o imóvel dele. Nós pagamos o IPTU mais alto, mas a nossa qualidade de vida caiu 90%. Por que a gente continua pagando por uma coisa que a gente não recebe?”.
William Hossell também apoiou a manifestação. Presidente da associação de moradores “Anima, Leblon”, fundador do movimento “Metro Linha 4 que o Rio precisa”, ex-metroviário e participante do Fórum de Mobilidade ele oferece apoio técnico ao movimento. Segundo ele, “para construir um metrô do Rio até Niterói, por baixo da Baía da Guanabara, se gasta 3 bilhões. Aqui, já está em mais de 10 bilhões e não vai parar por aí”. William criticou a dificuldade do governo do estado em reconhecer os erros do projeto. “Eles estão errando e não têm humildade para aceitar o erro e consertar as coisas. Houve tempo suficiente para fazer todos os estudos e, ainda assim, eles colocam um shield, que é o maior do mundo, na superfície. Podiam ter alugado essa máquina, mas gastaram 100 milhões de reais para comprá-la. Fizeram tudo errado e agora estão injetando concreto para segurar a rua. Vão ter que seguir com essa obra até o Leblon, sem limite de gasto. O governo do estado fez questão de estender o contrato de gestão para a atual concessionária. Aqui eles fazem as coisas erradas, fingem que está tudo certo e seguem adiante. Não dá para confiar, as pessoas estão com medo. Estão sempre inventando uma desculpa. A Odebrecht deve estar envergonhada com isso, eu estaria. Eles mentem com uma convicção que convence quem eles querem. Cuidado com eles!”, finaliza.
O Consórcio da Linha 4 do metrô informou que o projeto foi minuciosamente estudado e está sendo executado com "o que há de melhor na engenharia nacional e internacional". Veja a nota do consórcio:
O projeto da Linha 4 do Metrô na Zona Sul do Rio de Janeiro foi minuciosamente estudado por mais de 200 especialistas e está sendo executado com o que há de melhor na Engenharia nacional e internacional. Foram vários os estudos realizados, com desenvolvimento de metodologias e modelos geomecânicos, todos estes norteados por uma vasta campanha de sondagem, investigações geológicas e ensaios de caracterização do subsolo. As obras seguem os mais rígidos padrões de qualidade e segurança, e o Consórcio Linha 4 Sul, responsável pelas obras entre Ipanema e Gávea, conta com a assessoria dos melhores técnicos nacionais e dos mais renomados técnicos internacionais, reconhecidos por todas as entidades do setor de tuneleiros e todo o meio geotécnico. As metodologias adotadas na Linha 4 do Metrô são amplamente utilizadas em todo o mundo.
Em uma obra deste porte, os imóveis do entorno das escavações dos túneis e estações são monitorados permanentemente a fim de garantir a segurança dos prédios. Os prédios recebem instrumentos (pinos de recalque e clinômetros) que possibilitam o acompanhamento de como as edificações se comportam antes e durante as obras. Todas as medições desta instrumentação estão dentro dos limites esperados, sem risco para as edificações.
* Do Programa de Estágio do Jornal do Brasil