SOLAR MENINOS DE LUZ

Família luta para cuidar da infância no Pavão-Pavãozinho

  • Solar Meninos de Luz, escola filantrópica para 450 alunos, enfrenta crise
  • Dívida ultrapassa R$ 500 mil
LIANE GONÇALVES (EMAIL)

Solidariedade. Iolanda Maltaroli, cercada por alunos do Meninos de Luz Foto: Pablo Jacob
Solidariedade. Iolanda Maltaroli, cercada por alunos do Meninos de Luz Pablo Jacob
RIO - Às vésperas do Natal de 1983, a pedagoga Iolanda Maltaroli subiu o Pavão-Pavãozinho com os filhos para ajudar as vítimas da queda de uma caixa d’água, que tinha deixado 14 mortos e dezenas de desabrigados. Nos dias seguintes, ela voltou ao morro levando amigos e mais donativos. Sobre uma grande pedra, ao lado do local da tragédia, os filhos de Iolanda brincavam com as crianças; os adultos prestavam apoio social, médico e espiritual às vítimas. Desde então, a família Maltaroli não saiu mais do Pavão.
— Eu morava na Sá Ferreira (em Copacabana) e nunca tinha vindo ao morro. Quando chegamos aqui naquele dia, eu fiquei perplexa com o sofrimento deles. Eu tinha que fazer algo para mudar aquela realidade — relembra Iolanda.
Quase 30 anos depois, a iniciativa de Iolanda, que começou com aulas de costura e alfabetização, se transformou num grande complexo educacional para 450 alunos em horário integral, o Solar Meninos de Luz. A dedicação dos Maltaroli e a solidariedade de parceiros e voluntários, no entanto, não têm sido suficientes para manter a entidade filantrópica.
— Vivemos em crise a vida toda, mas essa é a pior. Temos ótimos parceiros, mas precisamos de mais ajuda — diz Iolanda.
O Solar Meninos de Luz ocupa hoje cinco grandes casas na subida do Pavão-Pavãozinho, adquiridas ao longo dos anos. Há creche, salas de aula com computadores, duas quadras de esportes, uma biblioteca com 18 mil títulos, um teatro com 400 lugares, galeria de arte, sala de música, refeitório. Por dia, são oferecidas aos alunos, que se revezam entre diferentes atividades, cerca de 1.350 refeições.
— Pegamos as crianças para mudar essas famílias. Damos prioridade a filhos de traficantes, de drogados e de mães adolescentes. Queremos afastar essas famílias da miséria, do tráfico, para que eles não repliquem essa realidade — ressalta Isabella Maltaroli, filha de Iolanda.
Trinta violinos mudos
Uma das faces da crise que muito entristece Iolanda é o fim da orquestra do Solar. Os 30 violinos da escola estão mudos há algum tempo. Mas as crianças não perderam o ritmo: há 30 alunos matriculados na Escola Portátil de Música, onde fazem aulas de pandeiro, violão, flauta e cavaquinho.
Segundo Guilherme Maltaroli, outro filho de Iolanda, a entidade tem hoje uma despesa mensal de R$ 190 mil e uma arrecadação de R$ 120 mil. A dívida já está em R$ 500 mil, mas pode chegar a R$ 1,5 milhão se o Solar não conseguir o título de entidade filantrópica, que espera há quatro anos do governo.
No próximo dia 13, o Hotel Fasano e a Baco Multimídia promovem um leilão de vinhos para arrecadar fundos para a entidade. O evento será no Fasano, em Ipanema, a partir das 18h. Iolanda se orgulha de em 30 anos, apesar das dificuldades, nunca ter pedido ajuda ao tráfico. Ela conta que, logo no início de seu trabalho, recebeu de presente uma peça de tecido para as aulas de costura. Vinha do chefe do tráfico que circulava pelo morro, lembra ela, com as cartucheiras cruzadas no peito.
— Escrevi um bilhete agradecendo, explicando que não poderia aceitar o presente porque, um dia, eu teria que devolver e não teria como — conta Iolanda, que, no auge de seus 74 anos, sobe o morro todos os fins de semana em busca de novos alunos.


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