LIXO NO CANTAGALO



No Cantagalo, encostas ainda sofrem com despejo irregular de lixo

Local atrai ratos, insetos e reclamações de quem convive com montanha de detritos


Contraste. O Morro do Cantagalo, de onde se veem as praias de Ipanema e do Leblon, tomado por lixo: Comlurb diz que a coleta ainda não é adequada
Foto: Foto de leitor
Contraste. O Morro do Cantagalo, de onde se veem as praias de Ipanema e do Leblon, tomado por lixo: Comlurb diz que a coleta ainda não é adequadaFOTO DE LEITOR
RIO — Moradora da casa de número 32 da Rua Custódio Mesquita, no Morro do Cantagalo, em Ipanema, a comerciante Regina Cabral é dona de uma das mais belas vistas da comunidade. De sua janela, vê-se toda a praia do bairro até o Leblon, com o Morro Dois Irmãos ao longe. Mas se ela abaixa um pouco o olhar, depara-se com uma encosta cheia de lixo. O local, que fica ao lado do campo de futebol da favela, atrai ratos, insetos e reclamações de quem convive com a montanha de detritos. Regina diz que a coleta da Comlurb não dá conta do problema e que o lixo sempre volta a se acumular. Para a presidente da empresa, Angela Fonti, o Cantagalo representa o maior desafio dentro do trabalho que está sendo desenvolvido em 24 favelas pacificadas para adaptar a coleta às características de cada local. Ela acredita que, no Cantagalo, a empresa ainda esta longe de uma solução ideal:
— Realmente, ainda não conseguimos dar uma boa opção para os moradores, que acabam jogando o lixo em todo lugar, até pela janela. Estamos preocupados. Falta espaço para os pontos de coleta e, principalmente, um meio de tirar o lixo de dentro da comunidade. Não há acesso motorizado. O Cantagalo é cheio de escadarias e o elevador (que liga a Rua Barão da Torre ao morro) não pode ser usado para o transporte de lixo. Antes da construção dele, tínhamos um lixoduto na encosta. E não há outro ponto com boa inclinação para colocar um novo.
Angela afirma que, na favela vizinha, o Pavão-Pavãozinho, a coleta está bem resolvida. Mas que há uma outra favela onde a coleta precisa melhorar: Rio das Pedras, em Jacarepaguá.
Garis fazem até rapel
A longo prazo, a solução para o Cantagalo, segundo a presidente da Comlurb, virá com a abertura de logradouros, que está sendo feita pelo governo estadual. As obras permitirão a circulação dos triciclos motorizados, que já passam em outras favelas anunciando num alto-falante a chegada do gari. Mas, enquanto isso, Angela quer adotar medidas emergenciais. Ela pretende propor à concessionária Metrô Rio, responsável pelo elevador, que ele seja usado para descer o lixo entre meia-noite e 6h (horário em que fica fechado). Se isso for possível, serão instalados pontos de coleta no caminho até o elevador. Enquanto isso, o recurso de usar garis alpinistas e equipamentos de rapel para limpar as encostas continuará sendo rotina no Cantagalo. Todo dia, saem de lá e do Pavão-Pavãozinho cerca de 30 toneladas de lixo.
— A coleta tem sido mais frequente. Mas faltam garis para limpar o miolo do morro — diz a comerciante Regina.
Reclamações como as da moradora do Cantagalo se repetem no Morro do Salgueiro, na Tijuca, onde Moisés Amorim, dono de uma lanchonete, pode ser visto com frequência com uma vassoura na mão.
— Prefiro limpar por conta própria quando junta muita sujeira em frente à minha lanchonete. A Comlurb vem aqui todo dia, mas falta gente para varrer as ruas — reclama.
Uma das promessas de campanha do prefeito Eduardo Paes para o novo mandato é fazer mudanças na atuação da Comlurb nas favelas. Ele diz estar insatisfeito com o serviço.
Parceria com moradores
No Salgueiro, assim como em outras nove comunidades pacificadas (incluindo o Cantagalo), a Secretaria municipal de Conservação e Serviços Públicos, em parceria com a UPP Social, implantou o programa batizado como Vamos Combinar Uma Comunidade Mais Limpa, que busca fazer acordos sobre a eliminação de pontos de descarte irregular e sobre a utilização correta dos novos equipamentos de coleta. Os locais para colocar o lixo são decididos pela Comlurb junto com os moradores.
Na principal subida até o topo da comunidade tijucana, há cinco pontos com contêineres, sinalizados com mensagens que pedem que o lixo seja jogado ali. O pedido vem sendo respeitado pelos moradores, embora ainda haja bastante entulho espalhado em certos locais. Os equipamentos, no entanto, estão em más condições e é comum ver lixeiras quebradas. Para o morador Carlos Eduardo Lopes, é preciso que os moradores colaborem mais. Ele vive no local conhecido como Horta, onde costumam queimar o lixo.
— A fumaça incomoda. A Comlurb vem retirar o lixo, mas, às vezes, quando chegam, ele já foi queimado — diz.
Mais grave é a situação do Morro do Querosene, no Complexo do São Carlos, que está na lista dos locais que receberam o programa da secretaria. Ali, encostas com lixo, valas cheias de plástico, garrafas e ratos fazem parte da paisagem. A associação de moradores contabilizou este ano 175 pontos de descarte de lixo a céu aberto. Um deles fica nos fundos da casa de Lucimar Duarte Vieira, que mora no morro há três anos. Ela mantem portas e janelas constantemente fechadas para evitar a entrada dos insetos e do odor incômodo.
— A Comlurb só recolhe o lixo da caçamba que fica lá embaixo. Aqui ninguém vem. No alto do morro tem mais um ponto de coleta, de onde às vezes tiram os sacos. Mas é muito pouco. Como o lixo cai na vala que tem aqui atrás, ele não deixa a água escoar e minha casa fica úmida — lamenta a dona de casa.
De sua janela, Lucimar vê ainda, na entrada da comunidade, uma montanha de entulho de obras que só cresce.
Angela Fonti reconhece a importância de dar um destino adequado aos resíduos de construção civil nas comunidades, onde obras são uma constante. Segundo ela, é no Morro do Borel, na Tijuca, o primeiro a receber o novo modelo de coleta, que a situação está mais satisfatória:
— Estamos completando um ano de Borel limpo e temos uma resposta muito boa dos moradores. Eles já exigem, por exemplo, a troca de contêineres. Estamos entrando agora com a nova coleta no Jacarezinho e em Manguinhos. Nas duas favelas, já achamos espaços para nossas bases, de onde os caminhões levarão o lixo.
 

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