PILANTRA



Falso engenheiro preso em Ipanema atuava na área há mais de 10 anos

Felipe Sáles, JB Online

RIO - Há mais de 10 anos, o ator Edson de Abreu, de 45 anos, interpreta um único personagem: o de engenheiro civil formado pela Universidade Federal Fluminense (UFF), com pós-graduação pela University of California, gerente de uma multinacional e professor da Universidade Estácio de Sá. A interpretação lhe valia mais de R$ 8 mil mensais, mas só até ontem, quando o delegado Antenor Lopes Martins Júnior, da 13ª DP (Ipanema), desvendou todo o esquema e encerrou a promissora carreira de Edson. Que ainda tinha se recém-formado como teólogo, planejava fundar sua própria igreja e estava prestes a se casar com a irmã do chefe.
Em 1988, ele falsificou o diploma da UFF e entrou no mercado de trabalho exibindo os conhecimentos adquiridos no curso técnico de edificações do Cefet de Campos, no Norte Fluminense, sua cidade natal. O falsário chegou ao requinte de tirar a tradicional foto vestindo uma beca. Em seu extenso currículo, consta até o cargo de agente de negócios da Firjan. Atualmente, ganhava R$ 5.631 como gerente de suporte ao produto da Sinteq (multinacional fundada há mais de 60 anos) e R$ 2.500 para dar aulas de marketing, administração e negócios na Estácio. Ninguém na Sinteq foi encontrado para falar sobre o caso. Já a Estácio disse que vai acompanhar as investigações e que neste semestre o suspeito não estava lecionando.
Edson conseguiu – a polícia ainda investiga de que forma – uma identidade falsa com o nome Eddy de Abreu, por meio da qual movimentava cartões de crédito (American Express, Bradesco Latino e Chase, dos Estados Unidos) de contas no exterior. Morou quatro anos nos Estados Unidos, onde trabalhou como taxista, ator e onde teria aprendido o "ofício" de falsário.
Um golpe quase perfeito no sistema
A carreira de Edson naufragou depois que seu destino se cruzou com o do delegado Antenor – a derradeira etapa para dar o último golpe no sistema. Em dezembro, ele ganhou na Justiça o direito de mudar o nome para Eddie, como sempre foi conhecido. Com isso, abandonaria as identidades anteriores e ficaria com todos os documentos em um novo nome, limpo de quaisquer fraudes.
De posse da sentença, conseguiu até a tirar passaporte. Ao fazer o mesmo com a carteira de identidade, num posto do Detran, funcionários desconfiaram do fato de ser terceira via e remeteram o caso à 13ª DP. Edson foi várias vezes à delegacia, exigindo que Antenor tomasse providências rápidas e liberasse o documento. Ousado, chegou a ir à chefia do Departamento de Polícia da Capital reclamar do delegado.
Quando voltou à delegacia, Antenor pediu para que ele apresentasse a identidade. Edson disse que não estava com o documento, mas, ao puxar a carteira para pegar a habilitação de motorista, Antenor pôde ver que a identidade de fato estava com ele. Ao analisar o documento, viu que a data de nascimento e os nomes dos pais estavam alterados.
– Se ele conseguisse isso, seria o golpe perfeito – contou o delegado Antenor. – Tudo novo e limpo para fazer o que quisesse.
Edson confessou o crime e em seu carro foram encontrados vários documentos falsificados – como diplomas, identidades e até dois CPFs. Ele foi indiciado por falsidade ideológica, uso de documento falso e falsificação de documentos públicos e privados, penas que, somadas, podem chegar a 15 anos.
Acusado se formou em teologia e iria fundar sua própria igreja
A vida de Edson até parecia uma festa. Bem de vida, tinha um apartamento em Copacabana, trabalhava numa multinacional em Macaé, no Norte Fluminense, e tinha acabado de se formar em teologia pela Universidade Metodista de São Paulo. Noivo da irmã do chefe, foi preso logo depois de comemorar o 45º aniversário, em 31 de março – véspera do Dia da Mentira.
A noiva chegou aos prantos na delegacia dizendo que o amava e que não se importava com as acusações. Estava acompanhada do irmão Adriano Correa, que não teve a mesma clemência: anunciou a demissão na porta da delegacia.
Edson é descrito pelo delegado como uma pessoa extremamente inteligente, com fluência em espanhol e inglês. Ele teria começado a falsificar documentos nos Estados Unidos depois de ser deportado. Não tem passagens pela polícia brasileira, mas o delegado Antenor pediu à Polícia Federal para verificar a ficha criminal dele no exterior.
Ao que parece, ele pretendia mudar de ramo. Junto dos documentos falsificados o delegado encontrou uma carteira da Universidade Metodista de São Paulo. Edson admitiu que se tornara pastor e que tinha o objetivo de fundar sua própria igreja.
Arrogância
Entre os colegas de trabalho, Edson não parecia ser muito querido. Vigias da empresa gargalharam quando souberam, pelo Jornal do Brasil, do triste fim das aventuras de Eddie, o falso engenheiro.
– Ele reclamava de todos, era muito arrogante. Ninguém gostava dele – contou um dos vigias, que não quis se identificar. – Isso vai sair na TV? Vou ligar para todo mundo avisando para assistirem!
O advogado de Edson, Mozar Carvalho, tentou defender o cliente, classificado por ele como “vítima de transtorno obsessivo”. De acordo com Mozar, Edson tinha fixação pelo nome “Eddie” e sempre quis usá-lo oficialmente. Tudo não passa de uma confusão, segundo Mozar, que disse conhecer Edson “há anos”, mas não soube informar se ele se formou em engenharia, nem por que teria mudado os nomes dos pais na identidade.
– É uma pessoa com transtorno obsessivo compulsivo... quer dizer, compulsivo não, só obsessivo – explicou Mozar. – Ele nunca fez mal a ninguém, não é um estelionatário. O único problema é o nome.

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